Você já passou pela situação de, ao pegar uma caixa de leite no supermercado, ser advertido por alguém que passava naquele instante, pelo mesmo corredor, para não escolher embalagens cujo fundo apresentasse quadrados coloridos, pois indicaria que o leite foi reprocessado?
“As crenças de que os quadrados sinalizam que o leite foi reprocessado e de que a presença de pontos no fundo da caixa seria um sinal de que o leite é ‘de primeira’ são ideias muito populares que circulam há anos, mas sem base sólida. Não tem relação com a qualidade do produto”, esclarece Cynthia Zattera, nutricionista pela Universidade Veiga de Almeida (RJ) e pós-graduada em reprogramação epigenética.
Não dá para saber exatamente quando esses boatos surgiram, mas já em 2019 havia vídeos na internet e nas redes sociais sobre essas que seriam “dicas” aos consumidores desavisados.
Desconstruindo o mito da caixa
Segundo Patrícia Santiago, médica pela UEA (Universidade Estadual do Amazonas) e pós-graduada em nutrologia, os quadrados coloridos e os pontos no fundo das caixas de leite, conhecidos como “códigos de controle de impressão” ou “blocos de controle de cores”, são usados por fabricantes de embalagens, como a Tetra Pak, para garantir a qualidade da impressão. As cores são CMYK (ciano, magenta, amarelo e preto).
Esses marcadores ajudam a verificar, testar se as cores estão sendo impressas corretamente e se a máquina de impressão está alinhada. Cada cor no design da embalagem geralmente tem um quadrado correspondente, permitindo que os operadores identifiquem problemas e ajustem os equipamentos conforme necessário. É só para fins técnicos e sem relação com o leite.
Patrícia Santiago, médica pela UEA e pós-graduada em nutrologia
Santiago acrescenta que como os consumidores não estão familiarizados com os processos de impressão industrial e muitos se equivocam ao interpretar símbolos, essas teorias, baseadas em observações superficiais, ganham força. Da mesma forma como outro boato sobre números impressos no fundo da caixa de leite e que, de novo, apontariam que o produto havia sido reprocessado uma, duas, três vezes depois de vencido. Pura balela.
Leite não pode ser reprocessado
A bebida não pode ser reprocessada nem voltar a ser comercializada, uma vez que passou do prazo de validade. É um produto perecível e altamente suscetível à contaminação bacteriana. Portanto, o reprocessamento para consumo humano é uma prática proibida devido a preocupações com a segurança alimentar. A confusão acontece porque muitos acabam confundindo esse processo com outro, chamado de ultrapasteurização.
Essa é uma técnica de esterilização de alimentos líquidos que envolve submetê-los a altas temperaturas por segundos a fim de eliminar microrganismos que possam oferecer riscos. “Com esse processo, o leite pode ser armazenado sem refrigeração (antes de aberto) por até seis meses”, informa Dinah Ribeiro de Paula, nutróloga e coordenadora dos cursos de medicina integrativa e nutrologia da Faculdade BWS.
A médica Patrícia Santiago complementa que “reprocessar” o leite só poderia ser permitido em circunstâncias muito específicas e sob rigorosas normas de controle sanitário. O processo mais comum é a repasteurização, possível se houver algum problema identificado antes da distribuição inicial do produto. Mas não é feito indiscriminadamente, deve ser supervisionado por órgãos reguladores.
No que se basear para comprar
Diante de tantas opções de leite à venda, tenha em mente primeiro sua saúde. Não se guie, por exemplo, apenas pelo preço, marca ou design de embalagem. É preciso considerar alguma eventual alergia, intolerância ou sensibilidade ao produto. Da mesma forma se você precisa ingerir menos gordura para controlar o colesterol e reduzir seu peso, ou ingerir mais cálcio e proteínas. Mas mesmo sem nenhum problema ou necessidade, compre e utilize o alimento com moderação.
“Procure na caixa pelo selo de inspeção do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, o Mapa. Esse selo indica que o leite passou por um controle de qualidade e está de acordo com as normas sanitárias. Verifique também as datas de fabricação e validade. Escolha um produto com vencimento mais distante para garantir que terá tempo suficiente para consumi-lo”, orienta Cynthia Zattera.
No mais, leia atentamente o rótulo, para saber se o leite é integral, desnatado, sem lactose, ultrapasteurizado ou UHT e verificar suas informações nutricionais e quais aditivos químicos estão presentes nele.
Quanto à embalagem, deve estar em boas condições, sem rasgos, amassados ou vazamentos. Danificada ou sem lacre pode indicar que o leite não está fresco ou contaminado. Lembrando que, após aberto, o leite deve ser mantido refrigerado e consumindo dentro do prazo.