Até o início deste ano, apenas 3,9% das crianças brasileiras de até 5 anos – ou seja, 584.456 meninos e meninas – haviam completado o esquema vacinal primário de duas doses ou dose única contra a Covid-19, segundo a plataforma LocalizaSUS do Ministério da Saúde. Os dados são preocupantes e refletem o cenário de 2022, quando o país registrou uma morte por dia em crianças de seis meses a 5 anos em decorrência da doença. A vacinação do público de 3 a 5 anos é aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) desde julho do ano passado com a CoronaVac, e crianças a partir de seis meses podem receber o imunizante da Pfizer desde setembro.
Em 2022, o Butantan entregou 12 milhões de doses da CoronaVac para a imunização de crianças e adolescentes, cumprindo o que foi encomendado pelo governo federal. A secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde, Ethel Maciel, afirmou nesta sexta (6/1) que o estoque de imunizantes contra Covid-19 para crianças de até 5 anos está esgotado, e que o contrato com o instituto deve ser retomado em breve, segundo informações da Agência Brasil.
Uma das principais consequências da Covid-19 é a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Enquanto os casos de SRAG em crianças de até 5 anos subiram de 10.504 para 14.852 entre 2021 e 2022 (41,3%), o número de casos no público de 6 a 19 anos, que teve uma cobertura vacinal maior, caiu de 9.396 para 5.994 (36,2%). Cerca de 30 milhões de indivíduos de 5 a 19 anos foram completamente imunizados até o início deste ano, o equivalente a 68% dessa faixa etária.
Outra prova do impacto positivo da vacinação na população infantil está na queda de mortes: em 2021, foram 796 óbitos no público de 6 a 19 anos, e o número caiu para 330 em 2022 (uma redução de quase 60%). O total geral de mortes por SRAG no Brasil nos últimos dois anos teve uma queda expressiva de 84% (372.954 para 59.409), uma provável consequência da cobertura vacinal contra Covid-19 dos adultos.
De acordo com a diretora médica do Butantan, Fernanda Boulos, a imunização é a principal arma para combater os casos graves e mortes de crianças pela Covid-19. Em entrevista ao Portal do Butantan, ela ressaltou que diversas evidências científicas mostram que a vacina pode prevenir sintomas graves e evitar, inclusive, casos de covid longa – condição na qual os sintomas persistem por até um ano.
Uma pesquisa conduzida no Chile durante o surto da variante ômicron do SARS-CoV-2 mostrou uma efetividade de 69% da CoronaVac contra internação de crianças de 3 a 5 anos. Dados de farmacovigilância do país andino apontam que a vacina foi a mais segura para as crianças e teve a menor taxa de eventos adversos registrada (10,67 notificações a cada 100 mil doses).
Apesar da média de óbitos diários por Covid-19 no Brasil apresentar estabilidade, a alta de casos observada nos últimos dois meses e atual média de 21 mil casos por dia deixam claro que o vírus continua sendo um problema de saúde pública e que, nesse cenário, os não vacinados são os que correm mais risco.
Crianças não vacinadas têm 10 vezes mais risco de ter inflamação grave
Além da SRAG, a Síndrome Inflamatória Multissistêmica Pediátrica (SIM-P) é outra complicação grave e letal da Covid-19 que acomete crianças e geralmente acontece de duas a seis semanas após a infecção. O público pediátrico não vacinado é o mais suscetível a desenvolver o problema, que atinge as vias respiratórias e os pulmões e pode causar distúrbios no coração, levando à morte.
Um estudo conduzido na França mostrou que entre os casos de SIM-P que ocorreram em crianças já elegíveis para vacinação, entre setembro e outubro de 2021, 78,7% foram em indivíduos não vacinados. Outra pesquisa feita na Dinamarca apontou que o risco de SIM-P entre crianças não imunizadas é 10 vezes maior do que naquelas que receberam a vacina.
Até o final de 2022, o Brasil registrou 1.970 casos confirmados de SIM-P e 135 óbitos, um aumento de 37% e 57% em relação a 2021. O maior número de notificações ocorreu em crianças de 1 a 4 anos (37,8%/n = 744), faixa etária que também carrega a maior porcentagem de óbitos (29,6%/n = 40). Quase 60% das crianças acometidas pela síndrome desde o início da pandemia precisaram ser internadas em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e 20% necessitaram de suporte ventilatório invasivo.