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Comunidades tradicionais não precisam de licença para fogo

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quinta-feira (28) projeto do Poder Executivo que institui a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, disciplinando as situações nas quais será permitido seu uso e criando instâncias intergovernamentais para gerenciar respostas a incêndios nos biomas brasileiros. A matéria vai ao Senado.

O texto aprovado foi o substitutivo elaborado pela relatora, deputada Rosa Neide (PT-MT), ao o Projeto de Lei 11276/18. Conforme o texto, o uso do fogo será permitido em locais onde as peculiaridades o justifiquem para práticas agrossilvopastoris e com autorização prévia.

Outras situações são para pesquisa científica aprovada a cargo de instituição reconhecida; para a prática de prevenção e combate a incêndios; nas cultura de subsistência de povos indígenas, comunidades quilombolas ou tradicionais e agricultores familiares; e para a capacitação de brigadistas florestais.

No caso das faixas de domínio de rodovias e de ferrovias, será possível usar o fogo para reduzir material combustível vegetal e prevenir incêndios florestais, mas devem ser adotadas medidas de contenção segundo resoluções do Comitê Nacional de Manejo Integrado do Fogo, criado pelo texto.

Rosa Neide destacou a participação de vários pesquisadores em 30 audiências públicas ao longo do tempo de tramitação. “Tivemos a presença de pesquisadores e pesquisadoras discutindo como manejar fogo neste País para não serem transformados em incêndios. Sou parlamentar e professora, tenho 58 anos de idade e quero que os filhos e netos de todos nós possam sonhar com um mundo melhor e que o Brasil possa ser protagonista com relação à preservação ambiental”, afirmou.

Controlada ou prescrita
O substitutivo define os tipos de queimada como controlada e prescrita. A primeira é a usada para fins agrossilvipastoris em áreas determinadas; e a segunda ocorre com planejamento e controle do fogo para fins de conservação, pesquisa ou manejo dentro do plano integrado.

Se a queimada prescrita for realizada pelos órgãos responsáveis pela gestão de áreas com vegetação nativa ou plantada ela não depende da aprovação dos órgãos ambientais competentes. Mas, se for tocada por pessoas físicas ou jurídicas privadas, deverá constar de planos de manejo integrado do fogo e dependerá de autorização prévia desse órgãos.

Outra forma de praticar a queima controlada é pedir uma autorização específica, na qual o interessado deverá adotar algumas providências, como:

definir mão-de-obra e técnicas e equipamentos a serem utilizados;
preparar aceiros de largura condizente com as condições ambientais, topográficas, climáticas e com o tipo de material combustível;
comunicar aos vizinhos a intenção de realizar a queima controlada, informando data, hora do início e o local onde será realizada;
evitar a queima em períodos de temperatura mais elevada e em respeito às condições dos ventos predominantes no momento da operação; e
providenciar o acompanhamento de toda a operação até a extinção do fogo para adotar medidas de contenção.
O aceiro é uma faixa em que toda a vegetação é propositalmente retirada para evitar o alastramento do fogo em áreas que não se pretende atingir com a técnica.

Ao emitir a autorização para queima controlada, o órgão ambiental poderá exigir outros procedimentos dependendo da situação, devendo dar ao solicitante orientações técnicas. A emissão desse tipo de autorização poderá ser delegada a outros órgãos com capacidade comprovada.

Entretanto, o relatório proíbe a prática do fogo como método de supressão de vegetação nativa para uso alternativo do solo, exceto quando da queima controlada dos resíduos de vegetação.

O texto também prevê a possibilidade de que o órgão competente estabeleça critérios para concessão de autorização por adesão e compromisso, que também deverá seguir todos os requisitos ambientais e de segurança estabelecidos na Política.

A autorização de queima controlada pode ser dispensada para fins de capacitação em manejo integrado do fogo, desde que a área a ser queimada não ultrapasse dez hectares e a queima seja realizada de acordo com as diretrizes do comitê nacional de manejo.

Quilombolas e povos indígenas
Se a queimada for para agricultura de subsistência exercida por povos indígenas, povos quilombolas e comunidades tradicionais, conforme seus usos, costumes e tradições, o projeto não exige autorização, mas coloca algumas condições, como queima em épocas apropriadas a fim de evitar riscos de perda do controle; acordo prévio com a comunidade residente; comunicação aos brigadistas florestais temporários responsáveis pela área quando houver; realização de aceiros adequados; e incluir a queimada no calendário de manejo integrado do fogo se existir.

A implementação da política de manejo integrado nas terras dessas populações deverá ser formulado pelo Ibama, em parceria com a Funai, com a Fundação Cultural Palmares, com o Incra e com a Secretaria de Coordenação e Governança do Patrimônio da União. Está prevista ainda cooperação técnica e operacional.

A todo caso, a formulação do plano deve contar com a participação e concordância dessas populações e observar os protocolos comunitários, além de considerar os conhecimentos e práticas locais.

Quando o órgão ambiental autorizar a queima controlada em áreas limítrofes a terras indígenas ou territórios quilombolas e nas zonas de amortecimento de unidades de conservação deverá informar aos órgãos gestores respectivos.

Cancelamento
A autorização dessas queimas poderá ser suspensa ou cancelada pelo órgão autorizador nas hipóteses de:

comprovado risco de morte, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis;
interesse da segurança pública;
descumprimento da lei;
a qualidade do ar atingir índices superiores aos estabelecidos em lei;
os níveis de fumaça produzidos atingirem limites de visibilidade que comprometam e coloquem em risco as operações aeronáuticas, rodoviárias e de outros meios de transporte; e
comprovada ameaça a práticas culturais de povos indígenas, comunidades quilombolas e outras comunidades tradicionais.
O uso do fogo autorizado por proprietários de áreas contíguas poderá ocorrer na forma solidária, em que ambos respondem pela operação, contanto que para uma área máxima de 500 hectares.

Unidades de conservação
Sobre o manejo integrado do fogo em unidades de conservação, o substitutivo prevê que ele deverá colaborar para o cumprimento dos objetivos de criação, reconhecimento e conservação de cada área protegida.

Se houver sobreposição de terras indígenas, territórios quilombolas e unidades de conservação, o manejo integrado do fogo deverá ser planejado a fim de compatibilizar os objetivos, a natureza e a finalidade de cada área protegida.

Importância
Durante a discussão, o deputado Rodrigo Agostinho (PSB-SP) elogiou o projeto e disse que o Brasil, desde que começou o monitoramento pelo INPE, já teve mais 1,6 milhão de km2 de áreas queimadas, sendo que 65% foram de vegetação nativa. “Nós precisamos dos instrumentos [para manejo do fogo] e esse projeto é importante”, afirmou.

O deputado Bibo Nunes (PSL-RS) disse que a proposta contribui para baixar o número de queimadas, mas afirmou que elas podem ser importantes “no devido tempo, local e com todo cuidado”. Já a deputada Erika Kokay (PT-DF) afirmou que a nova política visa preservar o meio ambiente “num momento em que o Brasil tem um Ministério do Meio Ambiente capturado por uma política antiambiental”.

O deputado Subtenente Gonzaga (PDT-MG) afirmou que os bombeiros terão papel central na política de manejo do fogo. A deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC) agradeceu à relatora por permitir o uso do fogo por povos indígenas, ribeirinhos, quilombolas e outras comunidades tradicionais.

Reportagem – Eduardo Piovesan e Janary Júnior
Edição – Wilson Silveira

Fonte: Agência Câmara de Notícias

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