Diante da realidade da superlotação carcerária no país, o fortalecimento da pena alternativa desponta com um caminho no sistema penal. O Brasil é signatário das Regras Mínimas das Nações Unidas Sobre as Medidas Não-Privativas de Liberdade e as Varas Especializadas em Alternativas Penais começaram a ser implantadas a partir de 2001.
Foi a partir da Resolução n. 288/2019 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que essa política ganhou ainda mais força e começou a apresentar efetivas mudanças diante da cultura do encarceramento. Essa nova realidade foi trazida com o surgimento do programa Justiça Presente, atual Fazendo Justiça, que conta com a parceria do CNJ e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e com o apoio do Departamento Penitenciário Nacional (Depen).
Para fortalecer a iniciativa no estado, na sexta-feira (13/8), em Cruzeiro do Sul (AC), o Tribunal de Justiça do Acre (TJAC) assinou cooperação técnica com o Instituto de Administração Penitenciária do Acre (Iapen) e o Ministério Público e a Defensoria Pública do estado para implantar a Central Integrada de Acompanhamento de Alternativas Penais (CIAP) no município. As ações conjuntas vão concretizar o desenvolvimento de um modelo de gestão em alternativas penais com foco na intervenção penal mínima, no desencarceramento e na restauração dos danos e laços sociais.
A desembargadora Eva Evangelista, que atua na Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do TJAC, destacou os esforços para a viabilização da cooperação. “Este é um momento muito importante para o nosso Acre, em especial para Cruzeiro do Sul, para que possamos avançar neste assunto como qualquer outra política pública, em que a formulação de uma política penal não está focada, exclusivamente, no tema prisão. Ela deve estar pautada por estudos em profundidade, com respaldo em evidências e normativas, especialmente para garantir a estabilidade de egressos na sociedade e também evitar o aprisionamento daqueles que não detém perfil para serem mantidos confinados.”
Eva, que é decana do TJAC, citou como exemplo o Grupo Reflexivo Homens em Transformação desenvolvido pelo Tribunal. A iniciativa é conhecida pelos resultados positivos no processo de ressocialização, atuando na responsabilização de autores de violência doméstica que cumprem penas. A proposta é conscientizar essas pessoas visando a uma mudança de comportamento. Os encontros são formatados por uma equipe multidisciplinar do Judiciário acreano, que conta com assistente social e psicólogo. “Acredito muito na ressocialização e ela só ocorre com medidas em que o agressor reconhece suas responsabilidades.”
Parceria
O governador do Acre, Gladson Cameli também agradeceu aos esforços das instituições e o fortalecimento de parcerias nas ações. “É sempre muito bom estar em um evento como este celebrando parcerias com o Tribunal de Justiça e Ministério Público. São duas instituições sérias e que contam com o meu respeito. Sabemos que a situação de violência vivenciada no Acre nos preocupa, mas eu tenho a certeza que vamos virar esse jogo buscando viver em uma sociedade pacífica.”
A procuradora-geral Kátia Rejane reforçou a simbologia do ato. “A desembargadora Eva é uma mulher que inspira outras mulheres e agradeço o convite para este momento em que celebramos os 15 anos da Lei Maria da Penha, que é uma lei que veio para todo o Sistema de Justiça lembrar que existe um sistema voltado ao combate da violência contra a mulher. Estivemos por três anos seguidos em primeiro lugar no ranking de feminicídio e isso nos preocupava muito. Hoje, esse quadro começa a mudar e é graça aos esforços das instituições, que temos buscado dar cumprimento as medidas que recaem sobre a questão da violência contra a mulher.”
À frente do Iapen, Arlenilson Cunha, comemorou a existência da CIAP em Rio Branco e disse não ter dúvida do bom resultado que ela será também em Cruzeiro do Sul. “Temos que ter um sistema prisional que reintegra, ressocializa e devolva o indivíduo ao convívio social. A Ciap de Rio Branco atende mais de 700 cumpridores de medidas e este momento é marcante com a assinatura desse convênio para Cruzeiro do Sul. Mais de 1 milhão de reais que vai possibilitar alcançar 400 pessoas cumprindo medidas alternativas, ou seja, aqueles que vão sofrer um delito de menor potencial, mas que é imposto a mesma pena restritiva de direito, permitindo que ela seja acompanhada devidamente.”
Nova visão
A política de alternativas penais é pautada por uma nova pactuação federativa e integral do Sistema de Justiça em busca da redução do encarceramento e da criação de mecanismos que favoreçam a resolução de conflitos, a responsabilização dos ofensores e prevenção às violências e criminalidade. No Acre, o número de pessoas encarceradas vinha aumentando, tendo o estado alcançado a maior população carcerária em 2019, quando atingiu o número de 6.283 pessoas em suas unidades prisionais- excluídas as pessoas em monitoração eletrônica.
O ano de 2020 interrompe uma serie histórica de sete anos de crescimento, chegando ao seu último mês com 6.268 pessoas privadas de liberdade. Foi a primeira vez, em oito anos, que o estado não apresentou elevação desse índice, apresentando redução de 0,2%. Atualmente, o número de pessoas privadas de liberdade, segundo o Iapen, é de 5.989 (dados de julho de 2021). Desde 2018, é a primeira vez que esse número fica abaixo de 6 mil pessoas.