O Ministério Público Federal (MPF) enviou recurso ao desembargador presidente do Tribunal Regional da 1ª Região (TRF1) contra a decisão que suspendeu liminar que havia determinado à União a alteração de layout da nova carteira de identidade nacional (CIN), com o objetivo de assegurar o direito das pessoas trans.
Pela liminar, que foi suspensa na última semana pelo TRF1, o campo “sexo” deveria ser excluído do documento e o campo “nome” teria que ser unificado, sem fazer distinção entre os nomes social e civil. Além disso, a União também deveria incluir, nos cadastros federais, o campo “nome social” de forma que ele aparecesse antes do “nome de registro”.
O pedido do MPF demonstra que não existe prova da alegação da União de que a medida causaria lesão à ordem e à economia públicas, devendo ser levado em conta o fato de que a própria União concordou e anunciou a alteração do layout da CIN. Ou seja, há plena viabilidade econômica e administrativa para realização das alterações.
Sobre isso, o MPF demonstra que, em três oportunidades diferentes, a União deixou clara a viabilidade e a iniciativa para a mudança, tendo mudado de postura posteriormente, e apresentado o argumento de inviabilidade econômica apenas após a concessão da liminar.
Além disso, o MPF também mostra que grande parte dos avanços civilizatórios reconhecidos à população LGBTQIA+ no Brasil vieram de decisões da Justiça brasileira, que atuou para sanar omissões de outros Poderes e demonstrou que a intervenção do Poder Judiciário em políticas públicas voltadas à realização de direitos fundamentais, em caso de ausência ou deficiência grave do serviço, não viola o princípio da separação dos Poderes.
Para ilustrar, o MPF cita alguns exemplos, como o direito à retificação de prenome e “sexo” no registro civil sem a realização de cirurgia de transgenitalização, ou a garantia ao direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil.
O recurso, apresentado pela procuradora regional da República Michele Rangel de Barros Vollstedt Bastos, pede que seja exercido juízo de retratação pela Presidência do Tribunal, que é realizado quando o acórdão recorrido diverge do entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) ou do Superior Tribunal de Justiça (STJ) nos regimes de repercussão geral ou de recursos repetitivos. Caso o TRF1 decida não realizar o referido juízo de retratação, foi pedido ao Tribunal que acate o recurso apresentado pelo MPF e restabeleça a decisão liminar da origem.
Entenda o caso – Em janeiro deste ano, o MPF no Acre ajuizou ação, com pedido de liminar, para que a União unifique o campo “nome” – sem distinção entre o nome social e o nome de registro civil –, e exclua o campo “sexo” nos cadastros da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Os dados cadastrais são alimentados pelo Serviço de Identificação do Cidadão, sistema administrado pelo Governo Federal, a partir de decreto editado em novembro de 2023.
De acordo com o procurador da República Lucas Costa Almeida Dias, as regras atuais desrespeitam o direito ao nome social das pessoas transexuais e geram constrangimentos a integrantes da população LGBTQIA+ ao priorizar o nome de registro civil e o sexo biológico na carteira de identidade e sistemas governamentais. No pedido, ele sustenta que o desrespeito ao nome escolhido pelas pessoas trans e os entraves encontrados para fazer valer esse direito contribuem para o processo de invisibilização dessa população.
A liminar foi concedida em 28 de maio pelo juiz da 13ª Vara Federal Cível de Brasília, Mateus Pontalti, que acolheu o pedido do MPF e lembrou que a dignidade e o reconhecimento pleno de uma pessoa estão intimamente ligados ao respeito por sua identidade. “A identidade de um indivíduo é construída a partir de múltiplos fatores, sendo o nome um dos componentes mais fundamentais dessa construção”.
No entanto, a União entrou com recurso no TRF1 pedindo a suspensão da liminar sob o fundamento de lesão à ordem pública e econômica. Ao analisar o recurso, o Presidente da Corte, Desembargador Federal João Batista Moreira, acatou o pedido formulado pela União e determinou a suspensão da decisão liminar. Dessa forma, a Procuradoria Regional da República da 1ª Região (PRR1) entrou com o recurso contra a decisão que suspendeu a liminar, com o objetivo de garantir os direitos das pessoas trans.
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