Seja por uma cirurgia ou um corte decorrente de um trauma, a cicatrização da pele fará parte do processo de regeneração celular que visa restaurar a integridade e funcionalidade do tecido afetado.
A cicatrização é multifatorial, varia de pessoa para pessoa, e também depende da raça e do estilo de vida.
Ela também pode variar de acordo com o tipo de cirurgia e da região do corpo, devido a diferenças na vascularização, movimentação e exposição a agentes externos.
Áreas com maior movimento ou tensão, como articulações, podem apresentar cicatrizes mais visíveis.
Existe ainda áreas com maior predisposição a cicatrizes inestéticas, hipertróficas e queloideanas, como tórax e orelhas, assim como áreas com tendência a cicatrizes mais discretas, como as pálpebras.
Procedimentos que envolvem camadas mais profundas da pele tendem a resultar em cicatrizes mais significativas.
Além disso, cirurgias programadas e que geram feridas com pouca tensão geralmente terão melhores cicatrizes do que aquelas feitas na urgência e com infecção na região.
“A coloração das cicatrizes também varia de acordo com vários fatores, incluindo a genética da pessoa, a profundidade e a extensão da lesão e a eficácia do processo de cicatrização”, esclarece Márcia Linhares, dermatologista e chefe do Departamento de Laser da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia).
A exposição ao sol e certas condições de pele também podem afetar a pigmentação da cicatriz, tornando-a mais escura ou mais clara do que a pele ao redor.
Márcia Linhares, dermatologista
A cicatrização ocorre em três estágios principais:
Inflamação: Nessa fase, ocorre uma resposta vascular e celular, havendo uma vasodilatação, facilitando a chegada de células que preparam a ferida para o início da cicatrização, removendo detritos e microrganismos. Isso envolve a coagulação do sangue e a migração de células imunológicas para o local da ferida. Dura de 48 a 72 horas.
Proliferativa: Após a fase inflamatória, o corpo começa a reconstruir o tecido danificado. Células como fibroblastos são ativadas para sintetizar e depositar colágeno, formando tecido de granulação. Este tecido fornece suporte estrutural e vascular à área lesionada e há produção de novo tecido para reparar o local, se caracterizando por um aspecto vermelho, brilhante e úmido. Começa de 2 a 3 dias e pode durar cerca de 1 mês.
Remodelação: Também chamada de maturação, é nessa fase que ocorre a reorganização do tecido cicatricial para melhorar a resistência e a flexibilidade da região. Os fibroblastos continuam a sintetizar colágeno e outras proteínas. Este processo pode levar meses ou anos, dependendo da extensão do dano e da saúde geral da pessoa, resultando na melhoria progressiva da qualidade da cicatriz.
Para uma melhor progressão da cicatrização pós-cirúrgica, é importante seguir as orientações médicas, manter a área limpa e protegida, evitar movimentos bruscos e seguir uma dieta equilibrada.
Wendell Uguetto, cirurgião plástico do Hospital Albert Einstein
Alguns alimentos favorecem a cicatrização, como proteínas magras, vitamina C, zinco e antioxidantes.
Outras recomendações importantes
Manter a cicatriz seca para prevenir infecções;
Aplicar pomadas ou cremes cicatrizantes conforme prescrito pelo médico;
Evitar a exposição direta ao sol, pois a radiação UV pode escurecer a cicatriz;
Manter o local hidratado conforme orientação médica;
Fazer curativos quando indicado;
Evitar atrito e tensão sobre a cicatriz;
Evitar o tabagismo no período;
Não retirar crostas, pois fazem parte do processo de cicatrização;
Fazer um repouso adequado da região.
Fumar pode dificultar a cicatrização
A menor oxigenação do sangue provocada pelo tabagismo afeta a produção de colágeno, proteína que contribui para a hidratação e elasticidade da pele. Prejudica ainda a absorção das vitaminas A, C e E, importantes para o fechamento da lesão e consequentemente uma boa cicatrização.
Substâncias presentes no cigarro, como níquel e arsênico, provocam gangrena, que é a morte de um tecido causado por uma infecção ou falta de fluxo sanguíneo, e se torna mais um fator de piora da cicatrização.
Já a nicotina é um dos compostos que mais impedem a ferida de cicatrizar, graças ao aumento da liberação de catecolaminas, composto orgânico que contrai os vasos sanguíneos, diminuindo a passagem do sangue. O resultado é uma pele opaca e ressecada, o que dificulta a cicatrização.
É normal a cicatriz coçar?
Sim, a coceira é parte normal do processo de cicatrização e ocorre devido à liberação de substâncias inflamatórias como a histamina, formação de novos vasos e regeneração de nervos sensoriais. Começa ali na fase proliferativa, costuma ser leve e sua duração vai de semanas a meses, dependendo da natureza da ferida, velocidade de cicatrização e sensibilidade da pele.
Embora essa coceira inicial seja comum, uma cicatriz pode coçar devido a fatores como:
Irritação por uso de cremes inadequados, álcool, sabonetes antibacterianos, água salgada do mar, cloro da piscina, suor, ervas e folhas, como aroeira;
Ressecamento da região por exposição solar;
Lavagens excessivas;
Hidratação inadequada;
Alergia causada por curativos (micropore e esparadrapo);
Mudanças climáticas, clima excessivamente seco e temperaturas extremas;
Reação a produtos químicos;
Infecções da cicatriz;
Nervos danificados durante a cirurgia;
Crescimento excessivo de tecido cicatricial (cicatrizes hipertróficas ou queloides);
Reações alérgicas a materiais usados durante o procedimento cirúrgico.
O tratamento para a coceira vai depender do que está provocando a coceira e pode ser por métodos invasivos ou não invasivos, com hidratantes, pomadas ou até tratamentos a laser ou injeções de corticoide.
Coceiras intensas, persistentes ou acompanhadas de vermelhidão e inchaço da cicatriz devem ser avaliadas pelo médico.
Lais Filadelfo, cirurgiã dermatológica do Hospital São Rafael, em Salvador
Cicatrizes tardias também podem coçar
Isso pode estar relacionado a processos como queloide ou cicatriz hipertrófica.
A queloide tende a ultrapassar os limites originais da ferida ou corte, ficando maior e muitas vezes em formato de nódulos. Ela pode continuar a crescer e aumentar de tamanho ao longo dos anos. Ocorre com mais frequência em áreas como orelhas, ombros, tórax e costas.
Já a cicatriz hipertrófica se caracteriza por ser elevada com relação à pele normal, além de grossa e por vezes escura, mas costuma estar estrita aos limites da ferida. Esse tipo de cicatriz é causada por produção excessiva de colágeno durante o processo de cicatrização da ferida e pode regredir com o tempo e diminuir de tamanho até ficar na altura da pele. São mais comuns em áreas de maior tensão, como ombros e esterno (osso central do tórax).
“A cicatrização do caucasiano tende a ser mais fraca e do negro e oriental, mais forte. Ou seja, na fase inicial, a cicatriz do caucasiano é muito mais avermelhada, a fase inflamatória é muito mais exuberante, com neovascularização. Enquanto no negro e no asiático, a fase de proliferação é muito mais intensa. Por isso, o queloide é mais comum em negros e asiáticos e a cicatriz hipertrófica ocorre com mais frequência no caucasiano”, explica Wendell Uguetto.
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