Em 2021, em 14,9% dos municípios do país, os habitantes precisariam se deslocar por pelo menos uma hora para o município mais próximo com museu. Os dados retratam uma desigualdade regional: enquanto no Norte, os moradores de 70% dos municípios teriam que passar pelo menos esse tempo de deslocamento para acessar o equipamento cultural, no Sul, essa proporção era apenas 1,3%.
Os dados fazem parte do Sistema de Informações e Indicadores Sociais (SIIC), que além do acesso à cultura, traz recortes sobre as empresas, ocupação e importância do setor para a economia. A publicação foi divulgada hoje (1º) pelo IBGE.
Para entender o acesso potencial aos equipamentos culturais e meios de comunicação, os pesquisadores cruzaram os dados da MUNIC de 2021 e da PNAD Contínua. Assim foi possível verificar quanto da população vivia em municípios com e sem museu, teatros ou sala de espetáculo, cinema e rádio AM ou FM local. Em 2021, 76,1% da população vivia em municípios com rádio AM ou FM local, o maior acesso potencial entre os equipamentos, seguido por 69,4% da população em municípios com teatro ou sala de espetáculo e 68,6% com museu. Os cinemas estavam concentrados em municípios onde viviam apenas 57,4% da população.
Havia desigualdade no acesso aos equipamentos quando analisada a população por sexo, cor ou raça, grupo de idade e nível de instrução. Cerca de 31,4% da população do país vivia em municípios sem museus, mas essa proporção era maior para os homens (32,1%) do que para as mulheres (30,7%). Também havia maior concentração da população preta e parda em municípios nessa condição (36,6%) do que de pessoas brancas (24,8%).
Havia maior privação potencial desse equipamento entre as crianças e adolescentes até 14 anos (34,3%) e entre aqueles sem instrução ou com fundamental incompleto (38,7%). “Em relação às crianças, é particularmente preocupante haver um menor potencial de acesso, pois é importante ter contato com museus durante a infância para desenvolver interesse nas demais fases da vida”, diz o analista da pesquisa, Leonardo Athias.
Usando dados da MUNIC de 2021 e um modelo de cálculo de rotas, distâncias e tempos de deslocamento aplicado na Base de referência de distâncias rodoviárias, hidroviárias e aéreas, foi possível estimar o tempo que uma pessoa que mora em um município sem museu, cinema ou teatro levaria para chegar ao município com equipamento mais próximo.
No Norte, havia a maior proporção de municípios em que os moradores levariam mais de uma hora para acessar um deles. Além do acesso mais difícil a museus, em 80,4% dos municípios, os habitantes teriam que se deslocar pelo menos esse tempo para chegar a um município com cinema. Já a menor proporção de municípios nessa situação estava no Sul: 14,9%. No caso de teatro ou sala de espetáculos, 65,1% dos municípios nortistas estavam a mais de uma hora até o município mais próximo com o equipamento. No Sul, eram 4,0%.
Além de estarem mais presentes (em 29,6% e 23,3% dos municípios, respectivamente), museus e teatros tinham maior distribuição pelo território nacional do que os cinemas. Esse último equipamento, presente em apenas 9% dos municípios do país, estava mais concentrado no Sudeste do que nas demais regiões. “O cinema mostrou a maior seletividade territorial”, destaca Athias.
Outro ponto observado pelo estudo foi o tempo médio de deslocamento em cada uma das Unidades da Federação para acessar os equipamentos culturais no município mais próximo. Para cinema, por exemplo, nos estados do Norte, as médias foram sempre acima de uma hora de distância. O Amazonas teve o valor extremo (23 horas e 26 minutos). No Nordeste, os maiores deslocamentos seriam enfrentados pela população do Maranhão (1 hora e 58 minutos) e do Piauí (1 hora e 49 minutos). Em contraste, no Rio de Janeiro, uma pessoa que vive em uma cidade sem cinema precisaria se deslocar, em média, apenas 16 minutos para acessar esse equipamento.
“Os dados de média de tempo de deslocamento mostram inclusive as desigualdades dentro dos estados. No oeste da Bahia ou no norte de Minas Gerais, por exemplo, era necessário um tempo maior para se acessar os três tipos de equipamento estudados. No Amazonas, eram cerca de 13 horas e 48 minutos para se chegar ao município com museu mais próximo, enquanto nos outros estados do Norte esse tempo era menor. Já no Distrito Federal, esse tempo de deslocamento seria zero”, explica o analista.
Entre 2017 e 2018, 70,7% dos domicílios tinham pelo menos uma TV de led, plasma ou LCD
Nesta edição do SIIC, a partir dos dados da Pesquisa de Orçamento Familiares (POF) 2017-2018, investigou-se a presença de bens duráveis nos domicílios, o que permite mensurar o acesso potencial a bens relacionados à fruição cultural. Na grande maioria dos lares (70,7%), havia ao menos uma TV de led, plasma ou LCD e em menos da metade (41,5%), um microcomputador ou notebook. A presença de tablet nos domicílios era bem menor (13,3%).
A posse dos bens se dava de maneira desigual quando considerado o nível de instrução. Mais da metade (51,3%) das famílias em que a pessoa de referência havia concluído o nível superior tinha duas ou mais TVs de tela fina em casa. Quando a pessoa de referência não tinha instrução, essa proporção cai para 5,6%. Quase um terço (31,3%) das famílias em que a pessoa de referência era branca tinha mais de duas TVs, enquanto para as pessoas pretas esse percentual era de 16,0%.
Enquanto 58,5% das famílias do país não tinham um microcomputador ou notebook, 10,8% tinham dois ou mais. Naquelas em que a pessoa de referência não tinha instrução só 1,1% delas tinha dois ou mais microcomputadores ou notebooks, contra 36,6% daquelas com nível superior. Também há desigualdade quando se analisam os números regionais: apenas 6,0% das famílias no Norte e 6,5% no Nordeste tinham mais de um desses equipamentos em casa. “O acesso de crianças e adolescentes ao microcomputador, que está ligado ao acesso efetivo à internet, pode estar prejudicado pela ausência desse bem, cujo uso é mais individualizado do que o audiovisual”, analisa Athias.
88,3% dos usuários da Internet assistiram vídeos em 2022
Utilizando os dados do módulo de Tecnologia da Comunicação e da Informação (TIC) da PNAD Contínua, o SIIC analisou o acesso aos bens tecnológicos, que também é relacionado ao consumo potencial de conteúdo cultural. No ano passado, a grande maioria da população de 10 anos ou mais (86,5%) tinha um aparelho celular para uso pessoal. Essa proporção avançou 9,1 pontos percentuais (p.p.) em relação ao início da série histórica, em 2016 (77,4%).
O percentual de mulheres que tinham celular (88,0%) era maior que o de homens (85,0%). As pessoas brancas também tinham percentuais mais altos (89,4%) em comparação com as pretas e pardas (84,3%). Em 2022, cerca de 98,8% das pessoas com nível superior completo tinham celular.
Entre 2016 e 2022, o percentual de pessoas que acessaram a Internet pelo menos uma vez nos três meses anteriores à entrevista subiu de 66,1% para 87,2%. O celular foi o meio mais utilizado para esse fim: 159,9 milhões acessaram a rede por ele em 2022, o que representa 98,9% daqueles que acessaram a Internet. Quase metade das pessoas (47,7%) se conectou à Internet por meio da televisão ou outro equipamento, um forte aumento em comparação com 2016 (11,7%). Isso indica, por exemplo, o uso para streaming e videogame.
No ano passado, o uso de internet era mais comum entre brancos (88,9%) do que entre pretos e pardos. Também havia proporções maiores entre as pessoas de 15 a 29 anos (95,6%) e de 30 a 59 anos (91,9%) que os demais grupos etários. Na análise por nível de instrução, os maiores percentuais estavam entre pessoas com ensino médio completo ou superior incompleto (96,3%) e superior completo (98,2%).
Também foram investigadas as finalidades de acesso à Internet. Conversar por chamadas de voz ou vídeo foi a mais recorrente, apontada por 94,4% dos usuários. Esse percentual aumentou frente a 2016 (73,4%). A segunda opção mais apontada pelos usuários foi enviar ou receber mensagens de texto, voz ou imagens por aplicativos diferentes de e-mail (92,0%), que caiu 2,2 p.p. desde o início da série. Em seguida apareceu a finalidade de assistir a vídeos, inclusive programas, séries e filmes (88,3%) dos usuários, que cresceu 11,7 p.p. entre 2016 e 2022.
Por outro lado, o percentual daqueles que usaram a internet para enviar ou receber e-mail caiu de 69,2% para 59,4% no período. Isso pode indicar a preferência por formas de comunicação mais novas, que permitem maior interatividade, como os aplicativos de mensagens e as mídias sociais.
Índice de preços da cultura cresce menos que total do IPCA entre 2020 e 2022
O Índice de Preços da Cultura (IPCult) acompanha os valores de uma cesta de bens e serviços do setor. A série desse indicador começa em 2020, com 30 subitens culturais reunidos em seis grupos.
Foi analisada a evolução de pesos proporcionais em julho de cada ano entre 2020 e 2022. Nesse período, houve maior contribuição do subgrupo Serviços de telefonia, TV por assinatura e Internet (cerca de 60%), seguido por Despesas pessoais com produtos e serviços culturais, Artigos de residência e Produtos e atividades de ensino. Os subgrupos com menor participação na composição do IPCult foram Acessórios pessoais e Jornais, revistas e assinaturas.
Entre 2020 e 2022, o IPCult foi inferior ao IPCA, nas variações acumuladas em 12 meses. Nos três anos, em média, houve variação acumulada de 3,2% no IPCult contra 6,8% do IPCA. De acordo com o estudo, a maior diferença entre os dois índices foi marcada entre 2021 e 2022, o que é explicado pelos desdobramentos da crise econômica causada pela pandemia de Covid-19.
O subgrupo acessórios pessoais (10,0%) registrou a maior variação média de preços entre 2020 e 2022, seguido por Jornais, revistas e assinaturas (9,4%). Já as menores variações vieram de Produtos e atividades de ensino (3,8%) e Serviços de telefonia, TV por assinatura e Internet (1,1%).
Em 2021, 35,8% das viagens realizadas para fins pessoais foram motivadas por lazer
A partir das informações do módulo de turismo da PNAD Contínua, o estudo trouxe dados sobre as viagens realizadas pela população brasileira. À época, cada domicílio selecionado pôde relatar no máximo cinco viagens e três delas tiveram todas as suas características analisadas. Em 2021, em cerca de 12,7% dos domicílios, pelo menos um dos moradores havia feito alguma viagem. Isso equivale a 12,4 milhões de viagens no país e maior parte delas (85,4%) delas foi para fim pessoal, enquanto 14,6% foram por motivo profissional.
No total da população, o lazer representou 35,8% dos motivos das viagens para fins pessoais. Entre os domicílios de maior rendimento per capita, essa foi a principal razão desse tipo de viagem, enquanto para aqueles com rendimentos menores, as opções mais escolhidas foram “tratamento de saúde e bem-estar” e para “visita a parentes e amigos”. A pesquisa também estimou em 602 mil o número de viagens para cultura e gastronomia e 963 mil para natureza, ecoturismo ou aventura. Somadas, os dois tipos representaram 41,6% das viagens de lazer realizadas em 2021.
As viagens com principal motivo cultura e gastronomia e de natureza, ecoturismo ou aventura eram menos comuns em domicílios com menores rendimentos (abaixo de ½ salário mínimo per capita). Neles, o predomínio era das viagens para sol e praia (59,0%). Nesses domicílios, 11,1% das viagens de lazer foram para cultura e gastronomia e 17,0%, por natureza, ecoturismo e aventura. Nos domicílios na faixa de rendimento per capita de 4 ou mais salários mínimos, a motivação com maior proporção também era sol e praia (44,2%), mas duas opções de lazer tinham percentuais maiores que em outras faixas: cultura e gastronomia (19,1%) e natureza, ecoturismo ou aventura (29,6%).
Gastos públicos com a cultura crescem 73,1% em uma década
O estudo também abordou os gastos governamentais, das três esferas, com a cultura entre 2012 e 2022. Nesse período, as despesas públicas no setor cultural cresceram cerca de 73,1%, passando de R$7,9 bilhões para R$13,6 bilhões. Na esfera federal, houve redução de gastos de 33,3%, enquanto os estados e municípios aumentaram em 77,7% e 125,1%, respectivamente. Como referência, o IPCA cresceu cerca de 80% nesse período.
De acordo com os pesquisadores, expansões recentes são explicadas pelos recursos das Leis Paulo Gustavo e Aldir Blanc. No ano passado, houve o maior valor de gastos em cultura da série histórica. Enquanto as despesas do Governo Federal se mantiveram estáveis (R$1,2 bilhão), houve crescimento nas esferas estadual (R$3,5 bilhões) e municipal (R$4,3 bilhões).
Apesar disso, a participação da cultura no total de gastos caiu nas três esferas de governo. Na esfera federal, a retração foi de 0,07 p.p. frente ao início da série, em 2012, passando de 0,10% para 0,03%. Entre os governos estaduais, a redução também foi de 0,07 p.p. (de 0,41% para 0,34%). Já nos governos municipais, os gastos com cultura que representavam 1,05% do total das despesas em 2012 caíram para 0,81% em 2022, uma retração de 0,24 p.p.
Também foi estimado um total de R$ 3,9 bilhões de desonerações direcionadas ao setor cultural para o ano de 2022, o que equivale a um aumento de cerca de 140% em relação ao total de 2012 (R$ 1,6 bilhão). As principais modalidades em 2022 foram o Programa Nacional de Apoio à Cultura – Pronac (R$ 1,9 bilhão) e desonerações relacionadas à importação e venda de livros (R$ 1,6 bilhão).
Sobre o estudo
O SIIC (2011-2022) traz informações sobre a ocupação e o número de empresas nas atividades culturais, bem como o valor adicionado dessas atividades. Outros destaques são o Índice de Preços da Cultura (IPCult) e o acesso das famílias aos produtos e serviços culturais. Nesta edição, há dados sobre turismo de lazer e sobre equipamentos e políticas municipais de cultura, com detalhamentos por Grandes Regiões e, em alguns indicadores, por Unidades da Federação e Municípios.
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