Por Embrapa AC—-
Com mais de quatro décadas de atuação no Acre, a Embrapa disponibilizou uma gama de tecnologias para o desenvolvimento, inovação e sustentabilidade de cadeias produtivas estratégicas para a economia local e regional. Presentes nos alimentos que chegam à mesa das famílias amazônicas, nos produtos da biodiversidade da região, que conquistaram mercados nacionais e internacionais, e na madeira certificada utilizada na construção civil no Brasil e exterior, essas inovações tecnológicas proporcionaram avanços na produção agropecuária e florestal, com conservação ambiental, e ajudaram a gerar trabalho e renda no campo.
A adoção de tecnologias digitais tornou o manejo de florestas mais produtivo e sustentável. O Modelo Digital de Exploração Florestal (Modeflora), disponibilizado há 15 anos, é utilizado em 100% dos planos de manejo do estado do Acre e por empresas florestais de outros estados da Amazônia (Amapá, Roraima, Rondônia, Amazonas e Pará). A tecnologia fornece informações de alta precisão sobre as áreas manejadas, facilita o planejamento, execução e monitoramento das operações de campo e reduz em 31,5% os custos de produção, com baixo impacto ambiental, além de contribuir com o trabalho de fiscalização e controle realizado por órgãos ambientais.
Estudos de impacto mostram que, somente em 2021, o manejo de 40 mil hectares de florestas com uso do Modeflora rendeu uma economia de, aproximadamente, R$ 11 milhões para o setor florestal amazônico. Na fase atual, a ênfase das pesquisas é no desenvolvimento de sistemas avançados que integrem novas tecnologias digitais para melhorar a eficiência do Manejo Florestal 4.0, estratégia de produção florestal baseada na automação, geração, transmissão e tratamento de dados de alta precisão, com foco no aumento da eficiência na atividade.
Às versões iniciais do Modeflora, que integravam o Sistema de Posicionamento Global (GPS), Sistema de Informação Geográfica (SIG) e ferramentas de Sensoriamento Remoto (SR), entre outras tecnologias, somaram-se inovações científicas como o sistema de perfilamento a laser Lidar (Light Detection and Ranging), que permite mapear a floresta em 3D, e drones de última geração. Esses estudos envolvem o treinamento de algoritmos de inteligência artificial para realização de inventários florestais 100% automatizados e identificação de espécies florestais de valor econômico.
Segundo o pesquisador Marcus Vinício Neves d’Oliveira, a associação de diferentes geotecnologias permite aprimorar continuamente a capacidade do Modeflora de gerar informações cada vez mais precisas sobre as áreas manejadas, para a tomada de decisões assertivas na atividade florestal. “As imagens de alta resolução, fornecidas por essas ferramentas, viabilizam novos conhecimentos sobre o relevo e hidrografia da floresta, essenciais para o manejo de baixo impacto, e o desenvolvimento de metodologias que permitem conhecer a dinâmica de crescimento da floresta e estimar com precisão o volume de madeira e os estoques de biomassa e carbono existentes”, enfatiza.
Foco nas demandas
Criada em 1976, como Unidade de Pesquisa de Âmbito Estadual de Rio Branco (Uepae Rio Branco), em um cenário econômico de base extrativista, a Embrapa chegou ao Acre com a missão de desenvolver sistemas de produção agrícola e pecuários, em áreas recém-desmatadas, para aumentar a oferta de alimentos. “Nessa época, mais de 90% dos alimentos consumidos no Estado eram adquiridos no centro-sul do país por via aérea ou fluvial. Mais da metade (60%) da carne bovina consumida pela população acreana vinha da Bolívia e de outras regiões do País, o que encarecia e restringia o consumo do produto”, conta o pesquisador Judson Valentim, que está na Empresa há 43 anos.
Os primeiros projetos de pesquisa desenvolvidos no Acre contemplaram o manejo e diversificação de pastagens, culturas como milho e café, e estudos com fruticultura. Com a transformação da UEPAE Rio Branco em Centro de Pesquisa Agroflorestal do Acre, na década de 1990, a Embrapa realinhou o seu modelo de pesquisa e incorporou uma atuação mais regional, com foco em demandas do setor produtivo. A mudança trouxe o desafio de viabilizar uma produção sustentável em áreas de floresta e já desmatada, com ênfase no manejo dos recursos naturais do Bioma Amazônia.
A Empresa passou a investir em pesquisas com novas culturas agrícolas de relevância econômica e social para a região, como banana e mandioca, e com produtos não madeireiros com elevado potencial de mercado, incluindo a castanha-do-brasil e o açaí. Nos anos 2000, inicia as pesquisas com manejo florestal empresarial para redução dos impactos ambientais da atividade e valorização da floresta em pé e de seus serviços ecossistêmicos.
Bruno Pena, chefe-geral da Embrapa Acre, explica que além de desenvolver a produção, as tecnologias geradas pela pesquisa científica impulsionaram a economia e contribuem continuamente para melhoria da renda e qualidade de vida das famílias rurais do Acre e de outros estados da Amazônia. “Essas conquistas envolvem parcerias sólidas e duradouras com instituições públicas e privadas e com produtores rurais que acreditaram no poder de transformação da Ciência e ajudaram a assegurar o processo participativo no desenvolvimento e validação de dezenas de tecnologias para o setor produtivo”, ressalta.
De estado importador de alimentos para exportador de carne bovina
No segmento pecuário, as pesquisas realizadas em parceria com a Associação para Fomento à Pesquisa de Melhoramento de Forrageiras (Unipasto) resultaram no desenvolvimento de capins adaptados ao encharcamento do solo. Nos últimos 20 anos, a Embrapa Acre disponibilizou para o mercado 15 variedades de forrageiras dos gêneros Arachis, Brachiaria, Cynodon e Panicum, para cultivo em solos encharcados, característicos da Amazônia.
“O encharcamento do solo é uma das causas da Síndrome da Morte do Capim Braquiarão, doença considerada o principal fator de degradação de pastagens na Amazônia. Além de proporcionar longevidade às pastagens, as forrageiras resistentes se destacam pela qualidade nutricional da forragem, fatores que melhoram a dieta animal, a produção de leite e carne e a rentabilidade dos sistemas pecuários a pasto da região”, afirma o pesquisador da Embrapa Acre, Carlos Maurício de Andrade.
Paralelo ao trabalho com as gramíneas, a Empresa buscou alternativas tecnológicas para intensificar a produção pecuária na Amazônia. Entre 2019 e 2022 lançou duas cultivares de amendoim forrageiro, leguminosa com elevado teor de proteína (entre 23 e 29%), alta produção de forragem e tolerância a solos encharcados, para consórcio com diferentes tipos de gramíneas.
Valentim explica que o uso de leguminosas consorciadas com gramíneas é uma estratégia para garantir pastagens mais produtivas e forragem de alta qualidade para o rebanho, com baixo uso de insumos. Esse sistema aumenta a produtividade do rebanho e fornece nitrogênio para as plantas por meio de fixação biológica resultante da interação de bactérias do solo com as raízes da leguminosa, processo natural que reduz o uso de adubos nitrogenados e as emissões de gases de efeito estufa na atividade pecuária.
“A adoção dessa tecnologia, em larga escala, ajudou a desenvolver a pecuária no Acre e contribuiu para colocar o Estado na condição de exportador de carne bovina. Com um rebanho de 4,2 milhões de cabeças de gado em uma área de 2,3 milhões de hectares de pastagens, em 2021 a produção superou 80 mil toneladas do produto, resultado que garante o abastecimento do mercado interno e gera excedentes para exportação. Cerca de 60% da carne bovina acreana é vendida para outros estados”, destaca o pesquisador.
Fortalecimento da agricultura
Entre as soluções tecnológicas disponibilizadas para a agricultura acreana destacam-se diferentes variedades de mandioca, abacaxi e citros (laranja e limão), adaptadas às condições locais de clima e solo, cultivares de banana resistentes a doenças e variedades de maracujá mais produtivas, para processamento agroindustrial e consumo in natura. A Embrapa também disponibilizou sistemas de produção para essas e outras culturas, que possibilitaram aumento na produtividade e o atendimento de demandas de consumo da população e de programas governamentais de merenda escolar.
As alternativas para melhoria do processo de produção de farinha de mandioca, principal fonte de renda de agricultores familiares do Juruá, uma das cinco regionais do Acre, também estão entre os resultados da atuação da Empresa no Acre. Pesquisas realizadas em parceria com o Sebrae, instituições governamentais e agricultores familiares permitiram sistematizar e recomendar um conjunto de Boas Práticas de Fabricação para assegurar qualidade à farinha produzida nessa região, conhecida como farinha Cruzeiro do Sul, e garantir segurança alimentar para os consumidores.
“As Boas Práticas de Fabricação envolvem cuidados específicos para cada etapa do processamento, melhoram as condições de trabalho nas casas de farinha e agregam valor à produção. Quando adotamos esses procedimentos, o preço do saco de farinha com 50 quilos subiu de R$ 50 para R$ 120 e, desde dezembro de 2022, é comercializado a R$ 200. Hoje, geramos mais renda com o nosso trabalho e temos comprador certo para a produção”, comemora a agricultora Maria José Maciel, moradora do município de Mâncio Lima e presidente da Central Juruá, cooperativa que reúne produtores de farinha de cinco municípios da região.
Os estudos com a Farinha de Cruzeiro do Sul também contribuíram para a conquista da Indicação Geográfica (IG) pelo produto, em 2017, como reconhecimento do modo tradicional de elaboração, passado de geração para geração há mais de 100 anos, pelos agricultores do Juruá. “Essa certificação atesta a procedência do produto, evita fraudes com a sua denominação, valoriza a produção e contribui para a abertura de novos mercados, fortalecimento da economia e desenvolvimento local”, afirma a pesquisadora Virgínia Álvares.
As pesquisas para fortalecimento da agricultura permitiram, ainda, disponibilizar o modelo de produção conservacionista para solos arenosos do Juruá. A tecnologia possibilita recuperar a fertilidade de áreas onde a agricultura era inviável, permite diversificar as atividades agrícolas e contribui para a conservação do solo.
Em outro eixo de atuação, as tecnologias para recuperação e aproveitamento de áreas degradadas, disponibilizadas pela Embrapa, têm viabilizado o cultivo de grãos (soja e milho) em antigas áreas de pastagens, convertidas em sistemas de integração lavoura-pecuária, estratégia que contribui para intensificar a produção e expandir essas culturas no Estado.
Desafios para a pesquisa
Jana Saito, chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Acre, enfatiza que além de avanços significativos para o setor produtivo local e regional, uso sustentável dos recursos naturais e melhoria na qualidade de vida dos produtores, os conhecimentos e tecnologias geradas pela Empresa serviram de subsídios para a formulação de diferentes políticas de desenvolvimento do Estado, com destaque para o Zoneamento Agrícola de Risco Climático para diferentes culturas e o Zoneamento Ecológico e Econômico (ZEE), principal instrumento de gestão ambiental e territorial. Entretanto, as demandas da produção são crescentes e a necessidade de inovação é contínua.
“Um dos principais desafios para a pesquisa científica é elevar a eficiência dos atuais sistemas agropecuários regionais, para torna-los mais produtivos e sustentáveis, sem incorporação de novas áreas. Fortalecer o uso de sistemas mais integrados e intensivos é uma das estratégias viáveis para chegar a esse resultado. Outro enfoque científico necessário é o desenvolvimento de estudos para identificação e aproveitamento sustentável de bioinsumos regionais, para gerar novas alternativas de trabalho e renda para as populações amazônicas”, avalia a gestora.
Na opinião de José Luís Tchê, secretário estadual de produção e agronegócio, a Embrapa tem papel estratégico no projeto de desenvolvimento sustentável do Acre e da Amazônia. Apesar dos avanços, a produção agrícola em larga escala ainda não é uma realidade no Estado, mas, com tecnologias adequadas é possível consolidar cadeias produtivas de alto valor para a economia local e desenvolver produtos com qualidade diferenciada. “Além disso, o Acre conta com 85% da sua floresta nativa em pé, um vasto potencial bioeconômico e o desafio de converter esses recursos naturais em alternativas produtivas, com conservação ambiental. A pesquisa científica desempenha função transformadora nesse processo”, afirma.
Importância estratégica da Unidade
Instalada em Rio Branco, capital do Estado, a sede da Embrapa Acre ocupa uma área de 1.200 hectares, onde funcionam campos experimentais, laboratórios, casas de vegetação, setores administrativos e centro de treinamento, dentre outras estruturas de pesquisa e gestão. A Empresa também mantém um escritório de transferência de tecnologias na cidade de Cruzeiro do Sul, região do Juruá, desde 2002.
A localização na Amazônia favorece o desenvolvimento de pesquisas estratégicas para o uso sustentável de produtos da biodiversidade regional e valorização desses recursos no cenário nacional. Além disso, os estudos pioneiros com manejo florestal de precisão proporcionaram um novo olhar sobre os recursos florestais, redirecionaram as práticas na atividade e tornaram a Unidade uma referência em tecnologias digitais para o manejo de florestas tropicais.
As pesquisas desenvolvidas no âmbito do Programa de Melhoramento Genético de Forrageiras conferem ao trabalho da Embrapa Acre relevância estratégica no desafio de tornar a pecuária brasileira mais competitiva. As tecnologias disponibilizadas pela Unidade são aplicadas em escalas local, regional e nacional.
As pesquisas com povos indígenas, para fortalecer a produção agrícola, criar alternativas de renda e garantir segurança alimentar nas aldeias, também confirmam a importância da Embrapa Acre em temas de interesse nacional. Esse trabalho gerou subsídios para um acordo de cooperação técnica com a Fundação Nacional do Índio (Funai), com a participação de todas as unidades da Embrapa que atuam com populações indígenas. “Temos orgulho da trajetória da Empresa e o compromisso de continuar entregando ativos tecnológicos relevantes para o desenvolvimento e sustentabilidade da Amazônia e de outras regiões do País”, finaliza Bruno Pena.
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