Por Roseneide Sena*
Há exatos 8 anos, o Brasil começou a discussão por um marco legal para instituir o pagamento por serviços ambientais. Exatamente no dia 10 de fevereiro de 2015, o então deputado federal Rubens Bueno (PPS/PR) motivou o Projeto de Lei 312/2015, que originou a atual Lei nº 14.119, de 13 de janeiro de 2021, sancionando a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais – PSA.
Mas, afinal, que tipo de pagamento é esse?
Para facilitar o entendimento, vamos falar sobre os dois conceitos principais que estão envolvidos neste tema: o primeiro são os serviços ecossistêmicos, aquilo que a natureza protegida nos oferece, por exemplo: polinização, ciclagem de nutrientes, ciclo da água, regulação de gases (incluindo o carbono), regulação do clima, e outros; e os serviços ambientais, que são as atividades que nós, pessoas ou instituições, fazemos para manter a natureza protegida, garantindo que ela realize sua função com os serviços ecossistêmicos, por exemplo: recuperação de cobertura vegetal, preservação de matas ciliares, preservação de nascentes, melhoria da fertilidade de solos, e muitos outros.
Quando isso funciona de forma harmônica, abre-se a oportunidade para uma transação voluntária, inclusive em forma de benefícios econômicos, para remunerar o esforço de pessoas e/ou instituições (chamado de protetor recebedor), por realizar ações que preservam ou recuperam os serviços ambientais, investindo recursos próprios, para garantir e facilitar o pleno funcionamento dos serviços ecossistêmicos. Assim, esse protetor recebedor torna-se um credor de uma retribuição por parte dos demais beneficiários desse mesmo serviço. Temos muitos devedores neste processo. São entes públicos, privados, países, jurisdições, empresas, entre outros, dispostos a participar desse ciclo econômico.
Ou seja, finalmente aquele velho ditado: “neste mundo tudo tem seu preço” começa a fazer sentido. A teoria econômica que o diga. Conseguimos transformar elementos da natureza em ativos econômicos passíveis de remuneração.
E, finalmente, quando você diz que mora numa região como o Acre, com imensa riqueza ambiental, não está falando em sentido figurado, é concreto, é mensurável e até “monetizado” (sim, aquilo que todo blogueiro bem-sucedido conhece bem).
E faz total sentido. Veja só: Aquele refrigerante delicioso que você toma, desde a água até o corante, a fruta, e demais ingredientes, tem uma relação direta com os serviços ambientais que alguém presta, em algum momento, na escala da geração desse produto.
A importância do PSA se dá por ser um instrumento econômico, sendo uma ferramenta estratégica para a recuperação, a conservação e a preservação do ecossistema, pois ele estimula de forma concreta o protetor recebedor a prestar esse serviço ambiental muito mais ampliado e contínuo, especialmente mantendo a floresta em pé.
E quanto isso equivale?? Ahhhh!! Aí entra o outro lado do “economês”, que tudo tem seu “preço”. Você já sabe, mas o “valor” de qualquer coisa vai depender das vantagens que isso pode trazer para você e para o coletivo. Então, não existe uma tabela de preços, mas sim o quanto seu esforço está valendo para todos os viventes desse planeta.
Mas, pelo menos existem as modalidades passíveis de pagamento instituídas na Lei nº 14.119, quais sejam: pagamento direto (monetário ou não monetário), prestação de melhorias sociais à comunidade em áreas rurais e urbanas, compensação vinculada a certificados de redução de emissões de gases por desmatamento e degradação (basicamente REDD+¹ e crédito de carbono²), títulos verdes (a onda do ESG³), comodato (ainda não vi na prática), a cota de reserva ambiental (aquela mesma prevista no Código Florestal), além de novas modalidades que podem ser estabelecidas pelos entes reguladores.
O Pagamento por Serviços Ambientais traz à tona a necessidade de inserir na discussão a importância de se valorar e valorizar os serviços prestados, não só pelos ecossistemas, mas pelas pessoas que fazem atividades que preservam a capacidade plena dos serviços ecossistêmicos.
A finalidade é estimular a conservação como um instrumento de desenvolvimento social, ambiental, econômico e cultural das populações de áreas rurais, especialmente de comunidades tradicionais, povos indígenas e agricultores familiares, mas também da área urbana.
O propósito desse pequeno ensaio é estimular o olhar além do que está em voga ou na “moda”, e que acaba limitando nossa atuação, reduzindo as oportunidades, inclusive deixando de fora desse ciclo econômico aqueles que estão habilitados a essa remuneração essencial, justa e necessária. Ou seja, parafraseando o provérbio inglês, comumente usado pela macroeconomia, “é preciso ver a floresta que existe, além das árvores”.
Roseneide Sena é mestre em Administração e membro da Associação Brasileira de Pesquisa em Finanças e Investimentos Sustentáveis (Brasfi), chefe do Departamento de Crédito à Sustentabilidade e Produção, pela Seplan e coordenadora-geral do Programa REM Acre – Fase II.
¹ REDD+: Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação.
² A representação de uma tonelada de carbono que deixou de ser emitida para a atmosfera.
³ O acrônimo ESG, do inglês, Environmental, Social and Governance (meio ambiente, social e governança)
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