O declínio nas populações de aves está acontecendo mesmo em áreas da Floresta Amazônica que estão longe da interferência humana. A constatação é de um estudo feito por cientistas americanos da Louisiana State University (LSU) e realizado ao norte de Manaus-AM, na Área de Relevante Interesse Ecológico (ARIE) do Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais (PDBFF), um Grupo de Pesquisa do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTI).
A biodiversidade de avifauna de floresta não perturbada da Amazônia foi monitorada por mais de 35 anos. A redução na população de pássaros acontece principalmente com as aves que forrageiam no chão da floresta – os pássaros que vivem nas partes baixas da floresta e aqueles que se alimentam de insetos no solo.
“Achamos que o que está ocorrendo é uma erosão da biodiversidade, uma perda no número de espécies em um lugar onde nós esperaríamos que a biodiversidade pudesse ser mantida”, disse o professor do departamento de Recursos Naturais Renováveis da LSU, Philip Stouffer, que é o principal autor do artigo publicado da revista Ecology Letters.
Stouffer começou suas pesquisas de campo na Amazônia quando era pesquisador de pós-doutorado na Instituição Smithsonian, em 1991. Ao longo de 25 anos, com apoio da National Science Foundation, principal órgão de fomento à pesquisa dos Estados Unidos, ele levou adiante um longo monitoramento de aves no PDBFF, iniciado em 1980.
Em meados de 2008, ao longo deste monitoramento, ele e seus alunos notaram que algumas espécies de aves que eram abundantes quando o projeto começou, estavam desaparecendo. Dessa observação surgiu o plano de pesquisa para coletar dados atualizados para serem comparados com os dados levantados de 1980-1984. Colaboraram com a pesquisa os estudantes de doutorado da LSU, Vitek Jirinec e Cameron Rutt.
O professor Stephen Midway do departamento de Oceanografia e Ciências de Sistemas Costeiros da LSU, também auxiliou na pesquisa. Foram analisados dados coletados ao longo de 35 anos em 55 localidades diferentes.
Midway afirma que a base de dados é muito robusta e de grande variedade de lugares o que levou anos para ser construída. “O resultado não é um chute, é um padrão real, e parece estar ligado a eventos causados pelas mudanças climáticas globais, que estão afetando até mesmo este lugar praticamente intocado”, afirma o pesquisador.
O professor Stouffer destaca que o fato de os padrões de ocorrência de animais estarem mudando na ausência de mudanças na paisagem é um sinal de alerta. “Preservar apenas as florestas não será o suficiente para manter a biodiversidade das florestas tropicais”.
Para o ornitólogo e pesquisador do Inpa Mario Cohn-Haft, as mudanças nas populações de aves estão associadas a distúrbios humanos indiretos e podem ter várias implicações. “A gente está afetando a floresta, mesmo sem perceber, e as aves são esses indicadores da condição ambiental”, explicou o pesquisador do Inpa.
Cohn-Haft aponta que as espécies que diminuíram dentro da mata intacta são justamente as espécies mais sensíveis a qualquer distúrbio que afete a mata primária. “Que essas espécies sensíveis a impactos humanos estejam diminuindo onde nenhum impacto na floresta foi percebido é um alerta de que o alcance da interferência humana é muito maior que imaginávamos—chegando até as espécies que vivem em mata fechada”, alertou.
Na foto uma das espécies que mais declinaram em mata intacta foi o lendário uirapuru, Cyphorhinus arada, que vive próximo ao chão da mata. Foto Anselmo D’Affonseca